Octavio da Cunha Botelho
Caso a razão encontrasse a fé em uma livraria, quais recomendações de leitura aquela poderia sugerir para esta última? |
Estando um dia em uma livraria, a Razão
casualmente se encontra com a Fé. Ao vê-la, se surpreende e lhe dirige a palavra:
“olá senhora Fé, que surpresa vê-la em uma livraria, nunca nos encontramos aqui,
é a sua primeira vez”? A Fé respondeu, “olá, que prazer em vê-la! Sim, senhora
Razão, esta é a primeira vez que venho a uma livraria”. A Razão continuou: “que
bom tê-la aqui, por ser a sua primeira vez, gostaria de lhe mostrar a livraria
e, ao mesmo tempo, lhe sugerir algumas leituras”. A Fé respondeu: “Ó, senhora
Razão, que gentileza sua, será um prazer”. Então, a Razão começou a caminhar e
se deparou primeiramente com a seção de livros de Matemática e se dirigiu para
a Fé e disse: “aqui senhora Fé, estes são os livros sobre Matemática, o que
acha da ideia de adquirir alguns deles”? A Fé pegou alguns e começou a
folheá-los. Depois de ler um tanto de suas páginas, reclamou: “hummm, senhora
Razão, estes livros exigem muito esforço de raciocínio lógico e exato, não
combinam com a minha natureza fantasiosa e imprecisa, estas leituras representam muito empenho
intelectual para mim”. “Ok”, disse a razão, “então vamos para outra seção”.
Em seguida, caminhando mais um
pouco, encontram a seção de livros de Filosofia. Aí a Razão disse: “Aqui,
senhora Fé, que tal estes livros”? A Fé então começou a folhear algumas páginas
de certos livros e reagiu: “Êpa, estes livros exigem esforço de reflexão
crítica, portanto não combinam com minha acomodada natureza condescendente”. “Tudo
bem, senhora Fé”, disse a Razão, “vamos para outra seção”. Caminharam mais um
pouco e encontraram a seção de livros de Ciências. Aí então a Razão perguntou:
“que tal estes”? A Fé novamente leu trechos de alguns livros e reclamou: “Ahhh...
estes livros exigem esforço investigativo com rigor metodológico, são muito cansativos para mim, pois contrariam minha natureza ingênua e comodista, ademais, não fui
educada para tão grande esforço”.
Daí, a Razão, já demonstrando sinais
de impaciência, conduziu a Fé até a seção de Informática e dsse: “Olha, esta é uma
das ciências mais importantes e utilizadas na atualidade, com certeza irá lhe
agradar, que tal”? A Fé, mais uma vez, folheou alguns livros para logo
desabafar: “Ah não! Estes livros exigem muito esforço racional e tecnológico,
portanto incomodam minha preguiça congênita”. Então, pensando já estar sem
opções de sugestões, a Razão não sabia mais o que indicar, até que, de repente,
teve uma ideia. Daí, convidou a Fé para o outro lado da livraria e lhe disse:
“olhe, esta é uma seção diferente de todas as outras, trata-se do setor de
livros infantis, veja se lhe agrada”. Em seguida a Fé folheou algumas páginas
dos livros e, diferente das outras vezes, se deteve mais na leitura até
exclamar entusiasmada: “Maravilha, estes livros são formidáveis, me agradou
muito, os temas me fazem lembrar os mitos e as lendas com os quais sempre
estive envolvida e, ademais, é muito fácil de entender, por isso vou
comprá-los”.
Com o aumento do secularismo no mundo, Deus passou a ter cada vez menos o que fazer. |
Então, começou a recolher muitos livros desta
seção, porém, curiosamente, ela colocava dois exemplares do mesmo título na
cesta de compras. Ao perceber isto a Razão observou: “Perdão, senhora Fé, mas
você está selecionando dois exemplares do mesmo título, você não precisa fazer
assim, basta um exemplar de cada”. Com isso a Fé respondeu: “Se fosse só para
mim, sim, mas quero presentear o senhor Deus com alguns livros, quando retornar
ao paraíso, por isso pretendo levar mais de um exemplar por título”. Surpreendida,
a Razão perguntou: “Com todo respeito, senhora Fé, mas o senhor Deus irá ler
estes livros infantis”? “Sim”, respondeu a Fé e continuou: “ele está muito
ocioso nos últimos séculos, pois depois que aumentou o secularismo no mundo,
com o crescimento do conhecimento científico e da tecnologia, bem como as mudanças
na Moral e na Política, o senhor Deus não tem quase mais nada para fazer, de modo
que preciso levar algo que ocupe o seu tempo, pois receio que ele entre em
depressão com tanta ociosidade, por isso vou presenteá-lo com estes livros
infantis”. “Mas”, interrompeu a Razão, “você acha que o senhor Deus vai gostar
de livros infantis”? “Sim”, respondeu a Fé, “porque, além de ser um presente,
será para ele um consolo também, uma vez que, lendo estas histórias infantis,
ele poderá se recordar do período da infância da humanidade, quando ele era
acreditado pela população em geral e tinha poder sobre todos. Ademais, ele
precisa de algo para fazer, pois desde quando o triunfo do secularismo o
aposentou, ele vem reclamando da falta de ocupação”. Dito isto, a Razão esboçou
um sorriso amarelo e disse: “bem, melhor ler isto do que não fazer nada”.
Então, as duas se encaminharam para
o caixa e para o setor de empacotamento para finalizarem a compra. Chegando o
momento de embrulhar os livros, a funcionária perguntou para a Fé: “prezada
senhora, qual estampa infantil de papel de embrulho lhe agrada mais, esta ou
aquela”? Com isso a Fé respondeu: “não precisar embrulhar com papel de presente
para criança, estes livros são para adultos”. A funcionária surpreendida
exclamou: “Ora, desde que trabalho aqui, esta é a primeira vez que vendemos
livros infantis para adultos lerem”! “Sim”, disse a Fé: “sua surpresa é
justificável, pois quando, em virtude da preguiça intelectual, não acompanhamos
a evolução cultural, somos limitados a entender apenas aquilo que as culturas
desenvolvidas têm de mais infantil, e isto é o que acontece comigo, pois ainda
estou na infância cultural da humanidade”.
Deus não está morto, certamente vive.
ResponderExcluirA simples diferença está em crer ou não crer.